Câmara de Piracicaba teve construção de sede financiada por taxa sobre escravidão e 1º presidente negro na década de 70

  • 01/08/2025
(Foto: Reprodução)
Cerimônia de inauguração do prédio atual da Câmara de Piracicaba em 1º de agosto de 1975 Reprodução/Arquivo Câmara de Piracicaba O atual prédio da Câmara de Piracicaba (SP) completa meio século de existência nesta sexta-feira (1º), data em que a cidade celebra o aniversário de 258 anos de fundação. Na cerimônia de inauguração do edifício, em 1975, o município recebia a nova sede do Legislativo pelas mãos do primeiro presidente negro. Era Antonio Messias Galdino que, em seu discurso, reivindicou o lugar de protagonistas para aqueles que construíram a história da Casa de Leis. Galdino lembrou que, no início de tudo, em 1822, quando um homem negro era proibido de entrar naquela instituição, a construção da Casa de Leis foi financiada com o imposto cobrado por cada homem escravizado. Um século depois, na década de 70, era um "descendente desses mesmos homens" quem entregava a Câmara à Piracicaba. O chefe da Câmara, como num acerto de contas histórico, em que "o passado e o presente se encaram" , como explicam os historiadores, redirecionou o povo negro para o centro da narrativa. 📲 Participe do canal do g1 Piracicaba no WhatsApp Antonio Messias Galdino, primeiro presidente negro da Câmara de Piracicaba Fabrice Desmonts "É nesse acerto de contas que a história revela sua maior força: a capacidade de resiliência, superação e justiça simbólica dos que, mesmo excluídos, ajudaram a construir os alicerces da democracia". Assim definem, os pesquisadores do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo da Câmara em publicação comemorativa nesta sexta-feira (1º). Na página 3, do Livro de Atas 01, da da Câmara Municipal de Piracicaba, as linhas abaixo resumem o que foi a primeira lei aprovada na história do Legislativo da cidade: “...e foi por todos unanimemente acordado que para as despesas da construção da nova casa da Câmara, Cadeia e Casinhas se lançasse uma finta de quatrocentos reis por cabeça de cada escravo (...) macho de sete anos de idade para cima.” , reproduz o documento. Ata de Instalação da Câmara Municipal em 11 de agosto 1822 Acervo Departamento de Documentação e Arquivo da Câmara de Piracicaba Imposto para financiar construção da Câmara A primeira lei aprovada pelo Legislativo local foi uma cobrança de impostos para quem mantinha escravos. O imposto era cobrado aos proprietários de terras pela posse de cada de cada escravo. O dinheiro seria usado na construção, dentre outras coisas, do que viria a ser a primeira sede da Câmara. "E assim foi feito. Em 1822, o primeiro edifício-sede da Câmara era uma casa simples, pequena, em sintonia com a então pequena localidade que, por aqueles dias, deixava de ser freguesia e se tornava uma vila. A Câmara se situava onde hoje está a Praça José Bonifácio, na parte próxima à rua Prudente de Moraes, próximo ao coreto", detalha o texto da série Achados do Arquivo. Em 1821, Piracicaba ganhou o status de vila e recebeu o nome de Vila Nova da Constituição, o que possibilitou a instalação da câmara municipal, já que a corte portuguesa não autorizava a viabilização de casas de leis em povoados e freguesias (condições anteriores de Piracicaba). Câmara Municipal de Piracicaba Rubens Cardia/ Câmara Municipal de Piracicaba Em agosto de 1822, o Brasil tinha conquistado sua independência, mas não havia abolido a escravidão, que perdurou por mais de 66 anos depois. "Era impensável que um negro pudesse sequer entrar no prédio da Câmara Municipal. "Essa situação contrasta com um acontecimento que viria a acontecer mais de um século depois", analisam os historiadores do Setor de Gestão de Documentação e Arquivo da instituição. Piracicaba chegou a ser a terceira cidade com maior número de escravos no estado, com 5.663. Campinas tinha 15.427 e Bananal possuía 6.903 escravos. Século 20 No início do Século 20, a Câmara de Piracicaba passou a funcionar junto à Prefeitura. "No prédio que, antes, pertencera ao Barão de Rezende, e que ficava na confluência das ruas Alferes José Caetano e São José", detalha o setor de documentação, onde hoje está o estacionamento da Câmara. "Na prática, esse imóvel servia como sede da Prefeitura, restando à Câmara ocupar uma pequena parte do prédio, que era uma espécie de apêndice da edificação principal. A sede da Câmara permaneceu nessas acanhadas instalações por mais da metade do século 20", resgata. Paço municipal Em 1967, o então prefeito Luciano Guidotti lançou projeto de edificação de um paço municipal, que ficaria no quarteirão compreendido entre as Ruas Alferes José Caetano, São José, Rosário e Prudente de Moraes. "As obras do seu prédio ficariam paralisadas devido a desentendimentos institucionais oriundos do momento político instável que Piracicaba vivenciaria naquele período. [...] O retorno da estabilidade só viria após 1972, com a eleição de Adilson Benedicto Maluf, que permaneceu no cargo entre 1973 a 1976. Todavia, o ânimo para melhores entendimentos visando à conclusão das obras do edifício da Câmara só viria no último biênio do mandato, com a eleição para a presidência da Câmara de um jovem advogado, jornalista e vereador de primeiro mandato: Antonio Messias Galdino", pontua. Galdino foi presidente da Câmara no biênio 1975-1976. Na época, considerou que as instalações do Legislativo eram incompatíveis com a dimensão institucional do Poder Legislativo. Antonio Messias Galdino, primeiro presidente negro da Câmara de Piracicaba Rubens Cardia Chuva durante velório na Câmara Com as obras paradas há quase dez anos, Galdino decidiu interceder pela conclusão do edifício. "O novo presidente da Casa entrou em entendimento com o prefeito, bem como com os vereadores, da situação e da oposição, sem exceções, a fim de que um objetivo maior do que qualquer divergência fosse alcançado o mais breve possível", comentam os historiadores da Câmara. A situação do minúsculo espaço até então ocupado pela Câmara estava precária. Em fevereiro de 1975 falecera o ex-vereador Jorge Antonio Angeli. O velório de Angeli aconteceu no plenário da Câmara e, durante o velório, começou a chover e começou a entrar água pelas goteiras do prédio, resultando na situação constrangedora de pingar água no defunto. O fato causou espanto e senso de urgência. VEJA TAMBÉM Piracicaba comemora 258 anos nesta sexta-feira, 1 de agosto de 2025 VÍDEOS: tudo sobre Piracicaba e Região Veja mais notícias da região no g1 Piracicaba

FONTE: https://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2025/08/01/camara-de-piracicaba-teve-construcao-de-sede-financiada-por-taxa-sobre-escravidao-e-1o-presidente-negro-na-decada-de-70.ghtml


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